A região periorbital é a mais atingida
por reações alérgicas causadas por
colírios, sombras, corretivos, rímel,
lápis, esmalte de unhas, tinta de jornal
FOTO: ARQUIVO
ser intensificada no controle e
aprovação de cosméticos
Ter olhos bem delineados, cílios longos, maças do rosto bronzeadas e pele lisa e hidratada como pêssego, quem não quer ter? Lançar mão do efeito mágico proporcionado pelos cosméticos (com função de limpeza, conservação e maquiagem) e os cosmecêuticos (com produtos ativos, de função preventiva contra doenças ou terapêuticas) existentes hoje no mercado é uma tentação difícil de frear, mesmo para os que têm a pele mais sensível.
Antes de se render à vaidade, porém, é preciso ficar atento aos dados contidos nas embalagens e bulários dos produtos, pois muitos ainda são comercializados sem nenhuma ou com informações incompletas, enganosas ou baseadas em estudos que não seguem uma metodologia clínica adequada. "Como médicos, respeitando questões éticas ou de honestidade para com a arte/ciência médica e o paciente, só devemos prescrever o produto que contem informações precisas sobre agentes ativos, veículos, conservantes, corantes, fragrâncias", destaca a professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), a dermatologista Maria José Nogueira Diógenes.
Leia a bula
Um fato que pode passar desapercebido por usuários menos atentos é a forma como são descritas as bulas e informativos dos cosméticos. "Muitos textos parecem traduzidos diretamente do país de origem, sem a preocupação em observar aspectos importantes relativos ao nosso clima", destaca a médica.
Um exemplo clássico são as orientações pouco claras sobre o uso correto de loções de limpeza (quanto ao tipo de pele, faixa etária). Tal esclarecimento é essencial, uma vez que nos climas frios e secos é indicado lavar menos a pele e usar pouco sabonete, enquanto nos trópicos é necessário reservar mais tempo para realizar a limpeza e detergencia (energia necessária para remover sujeiras da superfície). O ritual é destinado principalmente aos adolescentes e adultos jovens, cuja pele é mais oleosa (os poros tendem a dilatar mais no calor, favorecendo a formação de cravos/comodogênese). Nestes casos, as loções devem ser menos gordurosas, sendo necessário remover a maquiagem e lavar a face com sabonete (prescrito pelo dermatologista), conforme o tipo de pele (acneica, oleosa, seca ou sensível).
"A Agência de Vigilância Sanitária/Anvisa tem dado pouca atenção à liberação de produtos importados mais oleosos ou encorpados, próprios para climas frios e secos. Eles podem ser adequados para uso em cidades como Brasília (onde a umidade do ar muito baixa), mas não para o Norte e Nordeste, onde a umidade é maior e a temperatura ambiente é elevada o ano inteiro", explica Dra. Maria José.
Sol, manchas e perfumes
Que usar perfume e se expor ao sol pode manchar a pele, a maioria das pessoas já sabe, mas poucos estão atentos ao que diz o bulário de produtos que possuem perfume em sua composição. Parte dessa "culpa" recai sobre os órgãos de fiscalização, já que não há uma norma específica que determine a obrigatoriedade para que esse esclarecimento conste na embalagem.
No frio, como as roupas deixam o corpo praticamente todo coberto, o hidratante perfumado pode ser usado durante todo o dia, sem maiores problemas, ao contrário do verão. Os produtos com perfume para a face também levam em conta o mesmo princípio: mancham menos no clima frio (costuma-se ficar em ambientes fechados), enquanto no calor estamos sujeitos à exposição dos raios ultravioleta mesmo dentro de casa, no carro, no ambiente de trabalho. Nos locais abertos (mesmo em varandas), o sol penetra direta ou indiretamente, através do reflexo nas paredes, pisos ou mesmo nas roupas de cor clara.
"Temos que considerar que o sol dos trópicos incide mais perpendicularmente, aumentando os riscos de manchas por fototoxidade, fotoalérgicas e fotoenvelhecimento. Os bronzeadores artificiais devem ser evitados, principalmente os que recomendam exposição ao sol, uma vez que além das manchas e fotoenvelhecimento, há aumenta o risco de câncer de pele.
Riscos para a saúde
Tal como as drogas e medicamentos, muitos cosméticos podem colocar a saúde em risco. Isso é possível porque pode ocorrer absorção percutânea (uma substância penetra na pele até as mais profundas estruturas, inclusive a corrente sanguínea), gerando efeitos na pele e sistêmicos.
Dra. Maria José Diógenes cita como exemplos a ureia, cuja absorção percutânea pode levar à uremia (elevação de ureia no sangue); os compostos iodados podem causar bócio e hipotireoidismo transitório (em crianças); a antraquinona (babosa) é hepatotoxica; o ácido bórico pode causar vômitos, diarreia, convulsões e eritrodermia (eritema e descamação generalizada); o ácido salicílico pode levar à acidose metabólica; a neomicina pode provocar surdez neural.
Os corticóides podem ocasionar atrofia (no caso dos mais potentes ou clorados e fluorados) e supressão adrenal (se usados em áreas mais extensas de pele). "Os produtos bronzeadores são fototóxicos e podem favorecer a ocorrência de câncer de pele, se usados repetidamente", alerta a médica.
Segurança questionada
Por trás dos baixos preços (como de alguns cosméticos importados/estojos de sombras, pincéis, pós, esmaltes, batons) há uma qualidade altamente questionável. Comercializados livremente, muitos desses cosméticos agem como veículos de transmissão de conjuntivites, dermatites alérgicas (ou irritativas) e acne cosmética. Embora a maioria não contenha substâncias de maior toxidade, o mais prudente seria que a Anvisa determinasse normas no tocante aos componentes químicos, já que muitos fabricantes não informam os ingredientes utilizados.
Tão logo sejam observadas alterações na pele ou conjuntivas, deve-se suspender o uso. O ideal é que o usuário (de posse do produto) procure o dermatologista ou oftalmologista, levando as informações ou o próprio produto para que o médico realize uma investigação diagnóstica (análise da cor, apresentação, perfume, etc).
Reações
A face é mais susceptível às dermatites, uma vez que a pele é fina e vascularizada. Assim, o produto aplicado em outras áreas do corpo pode provocar dermatite na face (mesmo que não seja de uso facial, chega até ela veiculado pelas mãos). As reações alérgicas costumam ser mais frequentes na região periorbital, em decorrência do uso de colírios, sombras, corretivos, rímel, lápis, esmalte de unhas, tinta de jornal); pré-auricular, principalmente pelo uso de colônias/ perfumes.
Também são comuns reações nas áreas submandibular e pré-auricular, causadas por ação irritante ou alergia a resíduos de sabonete, loções e outros cosméticos não removidos corretamente. A face (exceto a região periorbital) é atingida pela ação de clareadores, esfoliantes ou cosmecêuticos usados na prevenção do envelhecimento.Continua na página 4
Cuidados
"O capitalismo alimenta-se do consumo e os cosméticos são foco de maior atenção"
"Há bulas e informativos que parecem traduzidos direto do país de origem"
Dra. Maria José Diogênes
Médica dermatologista
Fique por dentro Pele mais fina, cuidados redobrados
Os cosméticos usados por crianças, idosos e gestantes merecem atenção especial. Segundo o periódico Anais Brasileiros de Dermatologia, há risco de absorção percutânea influenciada pelas características físico químicas das drogas, barreira cutânea, superfície corporal onde é aplicado o produto (quanto maior a área, maior a absorção), imaturidade da barreira epidérmica e do sistema de metabolização das drogas.
Neste trabalho são citados vários produtos: anilina (pode causar meta-hemoglobinemia); hexaclorofen (antisséptico tópico) relacionado com encefalopatia; ácido bórico (pós para crianças) que causa vômito, diarreia, eritrodermia e convulsões; compostos iodados (podem levar a hipotireodismo transitório e bócio); ureia (causa uremia); tetracaína (anestésico tópico), que pode causar dermatites, se aplicadas em áreas restritas e reações sistêmicas (quando aplicada em áreas extensas ou em pele lesada), além de várias outras drogas com potencial tóxico, irritantes e alergênicos.
Importante: as áreas de maior absorção são as mais finas e vascularizadas (região genital, couro cabeludo, face, conjuntivas).
Restrições impostas aos alérgicos no ritual de beleza
O gerente de mineradora, Sérgio Luiz Sampaio Farias, 28 anos, é alérgico a odores provenientes de perfumes, hidratantes e protetores solares. A série de espirros e coriza intermitente surge mesmo quando ele está num ambiente onde os odores são um pouco mais fortes. Lembra que os primeiros sintomas surgiram aos oito anos, logo após usar uma conhecida marca de colônia infantil. Apesar de não ter enfrentado crises mais graves, Sérgio procura optar por perfumes mais suaves.
Nada mais doloroso para uma mulher do que ter de se desfazer de suas sombras, pincéis, delineadores, hidratantes e xampus. Para Fernanda Valéria Castro, 29, essa foi a única saída para por fim a coceira e vermelhidão que tomavam conta do seu corpo a cada nova tentativa em usar itens compostos de parabenos, produtos químicos amplamente utilizados como conservantes em maquiagens e quesitos de higiene.
Mayra Lima, 20 anos, também aprendeu cedo a lidar com as limitações impostas pelas crises alérgicas. O inchaço, vermelhidão e a incidência de pequenos caroços ao redor dos olhos possui como causa uma marca específica de produto (com sede no Texas/USA e que está presente em mais de 35 países). O susto aconteceu após usar um corretivo para olheiras. A partir do diagnóstico Mayra passou não só a evitar itens da marca como dedicar mais tempo para higienizar a pele antes de aplicar qualquer produto.
GIOVANNA SAMPAIO
EDITORA
Fonte:http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1015396
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