Processo de morte das células do cérebro tem início
entre dez e 15 anos antes de que os problemas de
memória se tornam aparentes
Demência: o que fazer para evitar um desastre global
A demência foi identificada por autoridades de saúde como "um desastre global prestes a acontecer", o maior problema médico enfrentado pela geração atual.
A cada quatro segundos, uma pessoa é diagnosticada com alguma forma de demência no mundo. Calcula-se que o número de casos cresça dos 44 milhões atuais para 135 milhões em 2050.
A demência já custa ao mundo US$ 604 bilhões por ano.
O termo demência é usado para descrever quadros médicos em que ocorre a perda - temporária ou permanente - das capacidades cognitivas de um indivíduo. Há múltiplas causas, entre elas, disfunções metabólicas, infecções, desnutrição ou doenças degenerativas como o Mal de Alzheimer.
Nesta semana, representantes do G8 - as oito maiores economias do planeta - se reunirão em Londres para discutir formas de lidar com o problema.
O governo britânico, que ocupa a presidência rotativa do G8, anunciou nesta quarta-feira que está dobrando a verba dedicada à pesquisa sobre demência para 132 milhões de libras (mais de meio bilhão reais) até 2015.
Segundo um relatório da Organização Mundial da Saúde em 2012, o Brasil é o nono país do mundo com o maior número de casos, com 1 milhão de pacientes com demência.
A BBC perguntou a especialistas da área quais seriam suas prioridades se recebessem os fundos necessários e carta branca para lidar com o problema.
Antecipar diagnósticos
No dia em que seu médico lhe diz que você tem demência, você pode pensar que está vivendo o estágio inicial do problema. No entanto, não é o caso.
O processo de morte das células do cérebro tem início entre dez e 15 anos antes de que os problemas de memória se tornam aparentes.
Ou seja, quando o paciente faz o teste de memória e recebe o diagnóstico, ele já está sofrendo da doença há pelo menos dez anos.
A essa altura, um quinto dos principais centros de memória do cérebro já estão mortos.
Para alguns especialistas, isso talvez explique a ausência de êxito em testes com medicamentos para tratar o problema: eles estão tentando tratar a doença quando já é tarde demais.
O foco na antecipação do tratamento "é absolutamente essencial nas pesquisas", disse o neurologista Nick Fox, do National Hospital for Neurology and Neurosurgery, em Londres.
Já houve algum progresso. Agora já é possível ver algumas das proteínas associadas ao Mal de Alzheimer em tomografias do cérebro, mas o desafio é usar esses recursos para prever o desenvolvimento da demência.
"Houve imensos avanços em tecnologias que produzem imagens so cérebro. Vivemos uma nova era e isso é muito empolgante", disse Fox.
Outros métodos estão sendo investigados, como, por exemplo, técnicas que identificam a presença, no sangue de uma pessoa, de substâncias químicas que ofereçam indícios do desenvolvimento futuro da demência.
Outro ponto que os pesquisadores ressaltam é que há vários tipos de demência. O Mal de Alzheimer, a demência vascular e a demência com Corpos de Lewi têm sintomas similares, mas talvez requeiram tratamentos diferentes.
Interromper mortes de células
Não há remédios capazes de interromper nem desacelerar o progresso de qualquer forma de demência.
Havia muita esperança em duas drogas para tratar o Mal de Alzheimer - Solanezumab e Bapineuzumab - mas elas fracassaram nos testes.
Os experimentos sugerem, no entanto, que existe uma pequena chance de que a droga Solanezumab surta efeito em pacientes em estágios bem iniciais da doença.
Uma nova série de testes está sendo feita em pacientes com demência moderada.
"Se o Solanezumab tiver efeito sobre casos moderados de Mal de Alzheimer, então o caminho seria dar (a droga) cada vez mais cedo", disse Eric Karran, diretor de pesquisas da ONG britânica Alzheimer's Research UK.
Alcançar a cura é, obviamente, o sonho de todo especialista nesse campo. Mas retardar a evolução da demência já traria um impacto gigantesco.
Segundo cálculos, se conseguíssemos atrasar em cinco anos o desenvolvimento da doença, já cortaríamos pela metade o número de pessoas vivendo com demência.
Drogas para sintomas
Existem algumas drogas que ajudam as pessoas a viver com os sintomas da demência, mas não são suficientes.
Há medicamentos capazes de aumentar as sinalizações químicas entre as células do cérebro que sobreviveram.
Mas o mais recente medicamento desse tipo, Memantine, foi aprovado em 2003 nos Estados Unidos.
Desde então, não apareceu nenhum outro.
O médico Ronald Petersen, diretor do Alzheimer's Disease Research Centre na Mayo Clinic, Estados Unidos, disse à BBC: "Isso é terrível quando você leva em conta os bilhões que foram investidos nessa doença".
"Existem 44 milhões de pessoas com Mal de Alzheimer e também temos de tratá-las" (além de encontrar uma cura).
"Precisamos desenvolver drogas para tratar os sintomas e retardar o progresso da doença, como fazemos com (pacientes que sofreram) ataques cardíacos".
Minimizar riscos
Você quer cortar radicalmente suas chances de desenvolver câncer de pulmão? Não fume.
Quer evitar um ataque cardíaco? Faça exercícios e adote uma dieta saudável.
Mas se quiser evitar demência, não há respostas definitivas.
A idade é o maior fator de risco. Na Grã-Bretanha, uma em cada três pessoas com idade acima de 95 anos tem demência.
Há indícios de que exercícios regulares e dieta saudável tenham efeitos positivos em prevenir ou retardar o desenvolvimento da demência.
Mas ainda não se sabe com clareza de que forma o histórico familiar, o estilo de vida e o meio-ambiente se combinam para que um indivíduo tenha ou não demência.
O geriatra Peter Passmore, da British Geriatrics Society e da Queen's University Belfast, na Irlanda do Norte, disse que o melhor conselho até agora é: "Manter o coração saudável para evitar danos ao cérebro".
"Evite a obesidade, não fume, faça exercícios regularmente, controle a pressão sanguínea, o açúcar e o colesterol."
"Isso tem poucas chances de fazer mal e pode até fazer bem!"
Como cuidar eficazmente
A demência tem custos imensos para a sociedade, mas as contas médicas respondem por uma porção pequena da custo total.
O custo real está no tempo passado em casas para idosos e na renda perdida por familiares que abandonam seus empregos para cuidar de parentes doentes.
As pesquisas também precisam ser direcionadas para a busca da melhor maneira de se cuidar de pacientes com demência. E também de preservar a independência do paciente pelo maior tempo possível.
Estudos já mostraram que a ingestão de remédios antipsicóticos pode ser cortada pela metade se equipes que trabalham com os pacientes receberem o treinamento adequado.
Doug Brown, da Alzheimer's Society, disse que talvez um dos campos mais fáceis de pesquisa sobre demência seja o estudo de como cuidar dos pacientes.
"Podemos fazer muitos estudos sobre a assistência e os cuidados que oferecemos às pessoas com demência hoje para que vivem da melhor forma possível".
Fonte:http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/12/131210_pesquisa_demencia_mv
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