‘Em quatro anos, tive burnout, câncer e sintomas de infarto e AVC’
Depois de ouvir os sinais de alerta do corpo, Daniela Falceta diminuiu o volume de trabalho e passou a priorizar a saúde
Por Marcella Centofanti, Colaboração Para Marie Claire — São Paulo
27/09/2023 08h43 Atualizado há um mês
O primeiro sinal de que algo estava errado foi em 2018. Após uma reunião tensa de trabalho, a arquiteta Daniela Falceta, de 46 anos, se sentiu mal. Ela chegou ao pronto-atendimento do hospital Hcor, em São Paulo, com sintomas de infarto: dor forte no peito e no abdômen, associada a formigamento e dormência no braço esquerdo.
Após uma bateria de exames, uma angiotomografia apontou que Daniela sofreu com espasmo coronário.
“Transtornos de ansiedade, depressão e stress agudo são considerados fatores de risco cardiovascular. Eles causam uma descarga de adrenalina que culmina com o espasmo coronário. A artéria se fecha por alguns minutos ou segundos. A pessoa sente dor no peito igual à do infarto, mas o espasmo não chega a matar o músculo cardíaco, porque é transitório. No entanto, se a Daniela não tivesse sido medicada, ela poderia ter infartado”, explica sua médica, a cardiologista Salete Nacif, do Hcor.
A arquiteta não teve sequelas. No entanto, nos quatro anos seguintes, ela enfrentaria outros problemas de saúde graves, até entender que precisava reduzir o ritmo alucinado de vida. Para ela, por trás de todos os males, está a sobrecarga que a sociedade impõe às mulheres.
“A cobrança sobre mim é diferente daquela sobre um engenheiro ou um arquiteto homem. Eu sempre tive que ser muito melhor que eles para me sobressair na carreira”, diz. A conta por trabalhar de 14 a 16 horas diariamente, somada à jornada de esposa e mãe de três filhos, uma hora chegou. “A gente nunca acha que o nosso gás nunca vai acabar, mas ele acaba. Não dá para ser a Mulher-Maravilha”, desabafa.
Um ano depois, câncer
Assustada com o espasmo coronário, Daniela diz que até ensaiou colocar o pé no freio. “Eu tentava mudar, mas as responsabilidades que eu já tinha assumido não me davam condição para uma mudança repentina”, afirma.
Um ano depois do problema no coração, a arquiteta foi diagnosticada com sarcoma, um tipo de câncer raro, na coxa direita. Ela recebeu a notícia do dia do seu aniversário de 42 anos e tratou a doença com uma cirurgia extensa, radioterapia e fisioterapia.
“Fiquei de cadeiras de rodas, depois muleta e bengala por um ano. Mesmo assim, não parei de trabalhar. Era época da Covid-19 e havia uma cobrança enorme dos meus clientes para eu ir presencialmente às obras”, recorda-se Daniela, especializada em arquitetura hospitalar. Ela se deparou com desafios como reforma de uma UTI em funcionamento, enfrentando prazos apertados e a constante pressão da responsabilidade.
Sintomas de AVC e diagnóstico de burnout
Em 2020, Daniela correu novamente para o pronto-atendimento do Hcor, desta vez com sintomas semelhantes aos de um acidente vascular cerebral (AVC): perda da visão, fala enrolada e paralisia em um lado do corpo.
“Eu fui diagnosticada com espasmo neurológico, algo que a médica explicou como sendo um pré-AVC. Foi um horror, até a hora em que ela me disse: “Você não está percebendo que isso não está bom? Ou você para ou você morre”, relembra a arquiteta.
Daniela começou a fazer terapia, a se consultar com um psiquiatra e a tomar remédio. Em 2021, descobriu que tinha burnout, uma síndrome relacionada à exaustão física, mental e emocional causada pela exposição ao stress crônico no trabalho.
Em 2022, a arquiteta adotou o modelo de home office, diminuiu drasticamente o número de obras que gerencia e passou a prestar consultoria para empresas. Embora tenha sido difícil reduzir sua equipe e adaptar seu estilo de vida, ela percebeu a importância de priorizar o bem-estar: “Eu continuo atuando na área, mas com 10% da carga que eu trabalhava antes. Descobri que dormir 3 horas por noite para dar conta da rotina frenética não era normal”.
Até os 40 anos, Daniela não teve nenhum problema de saúde. "Acho que eu gastei toda a minha energia vital nessas quatro décadas, porque depois a máquina começou a pifar. A médica falou que eu exagerei na quilometragem”, diz.
Para ela, trata-se de uma questão de gênero: “Eu converso com as amigas, que trabalham em várias áreas e isso parece um padrão entre todas. Nós trabalhamos muito mais do que os homens. A exigência que a sociedade e que a gente mesma se impõe é altíssima. Tem uma massa de mulheres doentes, cansadas e estressadas”.
Fonte:https://revistamarieclaire.globo.com/saude/noticia/2023/09/em-quatro-anos-tive-burnout-cancer-e-sintomas-de-infarto-e-avc.ghtml
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