O QUE TEM NUM VAPE? METAIS PESADOS E, TALVEZ ELEMENTOS RADIOATIVOS; ENTENDA

 O cigarro eletrônico (também conhecido como e-cigarro, vaporizador e vape) é um dispositivo que possui uma bateria e uma solução líquida que contém diferentes produtos químicos

O que tem num vape? Metais pesados e, talvez, elemento radioativo; entenda


Professor e chefe de saúde ambiental respiratória no Telethon Kids Institute expõe estudos sobre os compostos perigosos dos cigarros eletrônicos e alerta para a falta de informações sobre esses produtos

Por Alexander Larcombe* | The Conversation

27/08/2023 08h59  Atualizado há 4 meses

 

Se você me perguntasse o que há em cigarros eletrônicos, vapes descartáveis ou e-líquidos, minha resposta curta seria: “nós não sabemos totalmente”. A enorme e crescente variedade de produtos e sabores no mercado, as alterações nos ingredientes quando são aquecidos ou interagem entre si e a rotulagem inadequada fazem com que seja complicado responder a essa pergunta.

 A química analítica, incluindo a pesquisa da minha própria equipe, dá algumas respostas. Mas compreender os impactos na saúde acrescenta outro nível de complexidade. O risco dos cigarros eletrônicos para a saúde varia dependendo de muitos fatores, incluindo quais dispositivos ou sabores são usados e como as pessoas os usam. Portanto, os vapers simplesmente não sabem o que estão inalando e não podem ter certeza dos impactos disso à sua saúde.

O que nós sabemos?

Apesar dessas complexidades, existem algumas consistências entre o que diferentes laboratórios encontram nesses itens. Os ingredientes incluem nicotina, produtos químicos aromatizantes e os líquidos que os transportam – principalmente propilenoglicol e glicerina. É preocupante que também encontremos compostos orgânicos voláteis, partículas e carcinógenos (agentes que podem causar câncer), muitos dos quais sabemos que são prejudiciais.

Estudos indicam que, dentro dos vapes, estão substâncias carcinógenos — Foto: Pexels
Estudos indicam que, dentro dos vapes, estão substâncias carcinógenos — Foto: Pexels

Uma pesquisa que fizemos anteriormente também descobriu 2-clorofenol em cerca de metade dos e-líquidos que usuários compram para colocar em cigarros eletrônicos recarregáveis. Esse é um exemplo de produto químico sem razão válida para estar ali. Globalmente, o 2-clorofenol é classificado como “nocivo se inalado”. Sua presença acontece provavelmente devido à contaminação durante a fabricação.

E o polônio?

Um possível ingrediente que tem sido notícia nas últimas semanas é o polônio-210 radioativo, a mesma substância usada para assassinar o ex-espião russo Alexander Litvinenko em 2006. O governo de Queensland [na Austrália] está agora testando vapes para procurar esse elemento.

O polônio-210 pode ser encontrado em cigarros tradicionais e outros produtos de tabaco. Isso ocorre porque as plantas de tabaco absorvem tanto ele quanto outros materiais radioativos do solo, do ar e de fertilizantes com alto teor de fosfato.

Ainda não se sabe se o polônio-210 é encontrado nos aerossóis produzidos pelos cigarros eletrônicos. Embora isso seja viável caso a glicerina nos e-líquidos vier de plantas e fertilizantes semelhantes forem usados para cultivá-las.

Não são apenas os ingredientes

Além de seus ingredientes, os materiais de que são feitos os aparelhos de cigarro eletrônico podem acabar em nossos corpos. Metais tóxicos e substâncias relacionadas, como arsênico, chumbo, cromo e níquel, podem ser detectados tanto em e-líquidos quanto na urina, saliva e sangue de usuários de vape.


Estas substâncias podem representar riscos graves para a saúde (como serem cancerígenas). Elas podem vazar de várias partes de um cigarro eletrônico, incluindo a bobina de aquecimento, fios e juntas soldadas.

Isso não é tudo

O processo de aquecimento de um e-líquido para criar um aerossol inalável também altera a composição química dele para produzir produtos de degradação. Esses incluem:

  • formaldeído (uma substância usada para embalsamar cadáveres);
  • acetaldeído (uma substância chave que contribui para a ressaca após beber álcool);
  • e acroleína (usada como arma química na Primeira Guerra Mundial e agora utilizada como herbicida).

Esses produtos químicos são frequentemente detectados em amostras de cigarros eletrônicos. No entanto, devido aos diferentes aparelhos e à forma como as amostras são coletadas, os níveis medidos variam amplamente entre os estudos. Frequentemente, os níveis são muito baixos, levando os defensores da vaporização a argumentar que os cigarros eletrônicos são muito mais seguros do que fumar tabaco.

Os vapes têm conquistado um grande público nos últimos tempos, sobretudo entre os mais jovens — Foto: Pexels
Os vapes têm conquistado um grande público nos últimos tempos, sobretudo entre os mais jovens — Foto: Pexels

Mas esse argumento não reconhece que muitos usuários de cigarros eletrônicos (particularmente adolescentes) não eram ou não são usuários de cigarros, o que significa que uma melhor comparação é entre o uso de cigarros eletrônicos e a respiração de ar “fresco”.

Um usuário de cigarro eletrônico está, sem dúvida, exposto a mais toxinas e substâncias nocivas do que um não fumante. As pessoas que compram cigarros de tabaco também são confrontadas com uma infinidade de avisos sobre os perigos do fumo, enquanto os usuários de vapes geralmente não passam por isso.

Que tal usar rótulos?

Isso leva a outra razão pela qual é impossível saber o que está nos vapes – a falta de informação, incluindo advertências, nos rótulos.

Mesmo que existam rótulos, eles nem sempre refletem o que está no produto. A concentração de nicotina nos e-líquidos costuma ser bem diferente da que está no rótulo, e os e-líquidos “sem nicotina” geralmente contêm nicotina.

Os produtos também são rotulados com sabores genéricos, como “fruta vermelha” ou “tabaco”. Mas não há como um usuário saber quais produtos químicos foram adicionados para criar esses sabores de “fruta vermelha” ou “tabaco” ou as alterações nesses produtos químicos que podem ocorrer com o aquecimento e/ou interação com outros ingredientes e componentes do dispositivo. Somente o sabor “fruta vermelha” poderia ser produzido a partir de mais de 35 produtos químicos diferentes.


Os produtos químicos aromatizantes podem ser de “qualidade alimentar” ou classificados como seguros para consumo. No entanto, misturá-los em e-líquidos, aquecê-los e inalá-los é um tipo de exposição muito diferente, em comparação com comê-los.

Um exemplo é o benzaldeído (um aromatizante de amêndoa). Quando inalado, ele prejudica a função imunológica das células pulmonares. Isso poderia reduzir potencialmente a capacidade do usuário de vape para lidar com outras toxinas inaladas ou infecções respiratórias.

O benzaldeído é um dos oito ingredientes de e-líquidos proibidos na Austrália. A lista é curta assim porque não temos informações suficientes sobre os efeitos para a saúde caso sejam inalados outros produtos químicos aromatizantes e suas interações com outros ingredientes de e-líquidos.

Qual o próximo passo?

Para avaliarmos melhor os riscos dos vapes para a saúde, precisamos aprender mais sobre o que acontece quando os produtos químicos aromatizantes são aquecidos e inalados; as interações entre diferentes ingredientes do e-líquidos; que outros contaminantes podem estar presentes em e-líquidos; e novas substâncias potencialmente nocivas nos cigarros eletrônicos. Por fim, precisamos saber mais sobre como as pessoas utilizam os cigarros eletrônicos para que possamos compreender e quantificar melhor os riscos para a saúde no mundo real.

* Alexander Larcombe é professor associado e chefe de Saúde Ambiental Respiratória no Telethon Kids Institute (Austrália)

Este artigo foi originalmente publicado em inglês no site The Conversation.


Fonte:https://revistagalileu.globo.com/saude/noticia/2023/08/o-que-tem-num-vape-metais-pesados-e-talvez-elemento-radioativo-entenda.ghtml

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